Lava Jato : governadores receberam R$ 42 milhões em caixas dois ,diz Odebrecht





Rogerio Melo/PR
Pezão é o único governador citado nas delações da Obrecht que já tem ação de cassação em curso

Seis governadores implicados nas delações da Odebrecht receberam, na campanha vitoriosa ao governo, R$ 42,1 milhões em caixa dois, segundo delatores da empreiteira.

No total, nas últimas duas campanhas, os 12 governadores citados teriam sido contemplados com R$ 50,7 milhões em contribuições ilegais.

Em alguns casos, o caixa dois chega à quase metade dos valores declarados oficialmente à Justiça Eleitoral.

O governador do Rio, Luiz Fernando Pezão (PMDB), lidera a lista dos maiores beneficiários, tendo supostamente recebido R$ 20,3 milhões da empreiteira, segundo o diretor de infraestrutura da Odebrecht Benedicto Júnior, o BJ. O valor corresponde a 45% de tudo que o então candidato declarou oficialmente na campanha.

Além dele, Geraldo Alckmin (PSDB-SP), Marconi Perillo (PSDB-GO), Beto Richa (PSDB-PR), Raimundo Colombo (PSD-SC) e Marcelo Miranda (PMDB-TO) são acusados de supostamente terem recebido recursos não contabilizados em 2014.

Outros três governadores são suspeitos de terem recebido doações irregulares somente em 2010.

Integram a lista Tião Viana (PT-AC), com doações de R$ 1,5 milhão; Robinson Faria (PSD-RN), então candidato a vice, com R$ 350 mil; e Flávio Dino (PCdoB-MA), com R$ 200 mil.

O atual governador do Espírito Santo, Paulo Hartung (PMDB), também teria solicitado R$ 1 milhão a candidatos apoiados por seu partido no Estado –pagos em caixa dois, segundo os delatores.

Dos 12 governadores citados, três tiveram pedidos de inquérito autorizado pelo ministro do STF (STF) Edson Fachin –Tião Viana (PT-AC), Robinson Faria (PSD-RN) e Renan Filho (PMDB-AL). Eles aparecem em investigações ao lado de outros políticos com foro no Supremo.

Os nove governadores restantes tiveram seus processos remetidos para o STJ (Superior Tribunal de Justiça).

O caixa dois é a acusação mais frequente contra os atuais mandatários. Alguns são suspeitos de oferecerem contrapartidas em troca do apoio financeiro –o que, para a PGR (Procuradoria-Geral da República), pode configurar crime de corrupção.

Renan Filho (PMDB), governador de Alagoas e filho do senador Renan Calheiros (PMDB), teria recebido R$ 800 mil em doações legais da Odebrecht, mas, em troca, seu pai teria atuado para passar no Senado uma lei que beneficiaria a empresa. Já o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT), é acusado de receber R$ 13,5 milhões quando era ministro do Desenvolvimento para defender os interesses da empreiteira.

DEMORA

Ainda não se sabe se os governadores serão denunciados ou responderão a processo. Todos negam as acusações.

A doação via caixa dois é apontada por especialistas como forma de concorrência desleal nas eleições. No entanto, dificilmente os governadores perderão o cargo em função das delações.

Uma ação de cassação de chapa por caixa dois não é mais permitida: a lei eleitoral só prevê essa possibilidade até 15 dias após a diplomação dos eleitos.

"A essa altura, é quase impossível [cassar os mandatos]. O tempo é inimigo dessa discussão", diz a advogada Carla Karpstein, presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-PR.

No momento atual, um governador só sairia do cargo caso tivesse uma condenação criminal transitada em julgado –nesse caso, por acusações de lavagem de dinheiro, corrupção ou mesmo caixa dois (previsto na lei eleitoral). Isso geraria a suspensão de seus direitos políticos, e a consequente perda do mandato.

"Essas ações demoram. Mesmo sendo da Lava Jato", comenta Karpstein.

O risco maior é que os mandatários se tornem inelegíveis –mas, muito provavelmente, somente depois das eleições de 2018, em função do tempo das ações.

As delações, porém, caso sejam comprovadas, podem ter consequências políticas e ameaçar a reeleição ou candidatura dos mandatários no ano que vem.

Pezão é o único citado que já tem processo de cassação de mandato em curso. Em fevereiro, ele foi condenado Tribunal Regional Eleitoral do Rio por abuso de poder econômico.

Os juízes entenderam que sua campanha foi beneficiada pelo suposto esquema de corrupção de seu antecessor e padrinho político, Sérgio Cabral (PMDB), preso desde novembro. Ele tem direito a recorrer ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) no cargo.

TOMA LÁ, DÁ CÁ

O delator Benedicto Júnior afirmou nunca ter negociado vantagem pessoal com Pezão. O pedido de doação teria sido feito por Cabral.

Como contrapartida, a Odebrecht teria recebido o direito de tocar obras importantes no Estado, como a reforma do Maracanã, a construção da Linha 4 do Metrô, o Arco Metropolitano e o chamado PAC das Favelas.

A contrapartida era comum em outros casos, afirmam os delatores. "Ele tinha um perfil que nos interessava", disse o delator Fernando Reis, sobre o governador de Santa Catarina, Raimundo Colombo (PSD).

Colombo era favorável à privatização do saneamento no Estado –o que atendia a interesses da empreiteira, que diz ter doado R$ 4 milhões às suas campanhas em caixa dois.

Alguns pagamentos não tinham contrapartidas específicas. "Era a política da boa vizinhança", afirmou o delator Mário Amaro da Silveira, sobre o pagamento de R$ 1 milhão ao governador do Tocantins.

"Nós queríamos manter essa relação fluida", disse Benedicto Júnior, sobre o caixa dois a Alckmin.

No caso do governador Beto Richa (PSDB), do Paraná, a primeira contribuição à campanha, ainda em 2008, teria sido feita porque a empreiteira entendia que ele era "um expoente do PSDB".

O mesmo teria ocorrido no Espírito Santo, onde o governador Paulo Hartung (PMDB) supostamente pediu doações a outros candidatos do seu partido.

"Era uma relação muito correta. Ele não era uma pessoa patrimonialista, preocupada com aspectos financeiros. Ele cuidava da política, do partido dele", disse Benedicto Júnior, que afirmou nunca ter solicitado favores ao peemedebista.

OUTRO LADO

Os governadores nomeados na delação da Odebrecht negam ter solicitado favores indevidos à empreiteira e questionam a veracidade dos depoimentos.

A maioria afirma que as doações recebidas na campanha foram declaradas e aprovadas pela Justiça Eleitoral e que não houve caixa dois.

"A versão que está sendo noticiada é absurda, carregada de mentiras, ódio e revanchismo", afirmou o governador de Santa Catarina, Raimundo Colombo (PSD), sobre as acusações.

Em nota, ele destaca que não privatizou o saneamento no Estado e que isso pode ter motivado as denúncias. "É preciso separar o joio do trigo, a fim de evitar que sejam cometidas injustiças que se tornem irreparáveis", disse.

O governador do Espírito Santo, Paulo Hartung (PMDB), disse que as suspeitas são "delirantes e mentirosas", já que ele não concorreu nas eleições de 2010 e 2012, quando teria solicitado recursos em caixa dois à Odebrecht.

"Acusações infundadas como essa só contribuem para confundir, tumultuar a investigação e manchar a trajetória das pessoas de forma irresponsável", afirmou, em nota.

O governador Geraldo Alckmin (PSDB) informou, via assessoria, que os delatores "não apontam nenhum ato ilícito do então candidato". "Seu relato deixa claro que ele não presenciou conversa, pedido ou sugestão para a prática de qualquer delito."

O governador do Rio, Luiz Fernando Pezão (PMDB), disse, em nota, que que nunca recebeu recursos ilícitos e jamais teve conta no exterior.

Em nota, o governador do Acre, Tião Viana (PT), disse confiar na Justiça. "Tomarei todas as medidas judiciais cabíveis contra os delatores da calúnia e os propagandistas da desonra", disse.

ERRAMOS

17/04/2017  20h32 Versão anterior desta reportagem informava incorretamente que os 12 governadores citados tiveram abertura de inquérito autorizado pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Edson Fachin. Na verdade, esse é o caso de três deles: Renan Filho (AL), Robinson Faria (PSD) e Tião Viana (AC). Demais menções foram remetida para avaliação do STJ (Superior Tribunal de Justiça).

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