Sindicalista relata negociação do estado com facção e crê no financiamento do crime por políticos


  2016 7Em 1998, o então delegado da Polícia federal Protógenes Queiroz causou reboliço no meio político e nos corredores do Judiciário ao afirmar, em entrevista coletiva, haver, no Acre, um juiz traficante e um desembargador viciado. À época, a associação que representa a magistratura acreana repudiou as declarações do delegado, mas nenhuma investigação prosperou e as palavras do policial, ditas em sua passagem pela Superintendência da PF no estado, não passaram de um grande constrangimento às elites locais. Queiroz, que vive na Suíça em razão de asilo político, identificou, naquele ano, mais de 980 pontos de drogas (bocas de fumo) no Acre.

A reportagem relembrou as declarações do delegado para repercutir revelações exclusivas, feitas pelo presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários do Acre, Adriano Marques. Ele é categórico ao afirmar que o Estado negocia com as facções e relata que o custeio do crime pela classe política não é uma exclusividade dos centros mais avançados do país. Leia os principais trechos da entrevista.
Veja política – Como é a negociação do estado com líderes de facções?
Adriano Marques – Eu provo. Representantes da direção dos presídios fizeram várias reuniões com os líderes das organizações criminosas. Foram encontros que duraram mais de uma hora. Em seguida, foi dada ordem para que presos mais ligados a essas facções fossem retirados, em datas e horários pré-estabelecidos.

Foi um acordo de paz? Nós não sabemos o que discutiram ali dentro.

Por que alguns membros de facções têm televisores em suas celas? O governo precisa admitir seus erros, ouvir críticas construtivas. Nós fizemos a nossa parte. O Ministério da Justiça já foi informado, bem como o Ministério Público.

Políticos financiam o crime organizado?
Para combater o tráfico, é preciso conseguir mandado de prisão para invadir mansões. Esta não é uma realidade somente do Acre. Tem uma estrutura do estado que financia crimes, e os crimes financiam campanhas políticas. Eu gostaria de ter a estrutura de um policial federal, por exemplo, para poder te dar todas as provas sobre isso. A lava Jato está comprovando, dentre outras situações, que criminosos se disfarçam de empresários ou políticos e vice-versa para cometer ilícitos. O PCC no país movimenta mais que qualquer multinacional. Há pessoas muito bem instruídas por trás disso tudo fazendo lavagem de dinheiro.

Veja política – Você é inimigo do estado?
Adriano Marques – De forma nenhuma. Sou defensor de um sistema prisional minimamente estruturado, e de condições dignas para os nossos agentes trabalhar sem correr risco de morte. O Acre é responsável pela total falta de planejamento estratégico. O Acre tem, proporcionalmente, a maior população carcerária do Brasil. O estado não se deu conta de que ali, nos presídio, está tudo aquilo que não deu certo na sociedade. Foi preciso o Exército emprestar fuzis para a polícia agir nessa última rebelião. Cada viatura deveria ter um fuzil. O estado não possui essa arma, nem se planejou para comprar, enquanto as facções estão muito melhor servidas em termos de armamento.

Veja Política – A situação vai piorar?
Adriano Marques – Acredito que muitos criminosos estejam vindo para cá. Nós estamos expostos, fragilizados, em estado de guerra, e isso não é novidade para ninguém. Rio Branco e Cruzeiro do Sul já poderia ter os seus blindados, os conhecidos caveirões. Os PM´s são verdadeiros heróis. Eles dão o melhor de si. A minha crítica é ao estado. Ali, naquele embate contra as facções, muitos militares não usavam coletes, nem capacetes. Isso é um absurdo sem precedentes.

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