Um dos donos do grupo JBS, o empresário Joesley Batista relatou ter feito pagamentos que chegaram a US$ 150 milhões em propina "em favor" dos ex-presidentes petistas Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, mediante depósitos em contas distintas no exterior.
No despacho do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Edson Fachin, relator da Operação Lava Jato na Corte, consta a informação de que Lula teria recebido "vantagens indevidas" na ordem de US$ 50 milhões. Já Dilma seria a destinatária de US$ 30 milhões.
No seu depoimento à PGR (Procuradoria-Geral da República), Batista citou um valor total quase duas vezes maior, que em 2014 chegou a US$ 150 milhões --ou R$ 360 milhões, na cotação da época, segundo o delator.
O ex-ministro Guido Mantega, que atuou nos governos Lula e Dilma, atuaria como intermediário dos pagamentos, e os ex-presidentes teriam conhecimento do esquema. Os negócios seriam realizados no âmbito do BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento), da Petros (Fundação Petrobras de Seguridade Social) e da Funcef (Fundação dos Economiários Federais), "com objetivo de beneficiar o grupo empresarial JBS".
Fachin ainda relata que, segundo os colaboradores, o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto "solicitou a Joesley Batista a disponibilização de uma conta bancária no exterior para o depósito de valores, com a abertura de uma planilha de conta corrente para que os pagamentos fossem realizados mediante (a) notas fiscais com conteúdo e datas ideologicamente falsos; (b) em dinheiro; (c) depósitos em contas no exterior; (d) doações eleitorais dissimuladas".
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, também descreveu, de acordo com o despacho de Fachin, que o dono do grupo JBS confessou ter repassado R$ 30 milhões ao ex-ministro Antônio Palocci, preso no âmbito da Lava Jato, a pretexto da campanha de Dilma à Presidência em 2010.
Propina
Josley contou que desde 2005, contava com o apoio de Mantega --na ocasião, presidente do BNDES--, em favor dos interesses do seu grupo empresarial, inicialmente por intermédio de um amigo em comum, identificado como "Vic" --apelido do empresário Victor Garcia Sandri.
Em 2009, quando decidiu se afastar do intermediário, o empresário disse ter se reunido com Mantega --ministro da Fazenda desde 2006-- e combinado a forma de pagamento pela colaboração.
"Eu falei 'ministro, eu tratava com o Vic, fazia os depósitos pra ele, e agora, contigo, como é que eu faço?'. Ele falou: 'fica com você, eu não quero que você mande para conta nenhuma. Fica um crédito com você, no dia que eu precisar, eu te falo'", relatou o empresário.
Os dois acordaram, segundo Batista, que valor o pago por cada negócio que contasse com o auxílio de Mantega seria definido "caso a caso". "Eu sempre achei que esse dinheiro era dele, da pessoa física. Ao longo do tempo, quando chegou em 2014, o dinheiro foi usado na campanha da Dilma", contou.
O dono da JBS disse que, quando Dilma ganhou a eleição de 2010, Mantega, mantido no Ministério da Fazenda, pediu que ele abrisse outra conta, no primeiro negócio feito na nova gestão. "Foi aí a primeira vez que eu desconfiei que o dinheiro não era dele", comentou.
Quando questionado sobre o porque do pedido, o ministro teria dito, segundo Joesley, que a primeira era "a conta do Lula". "Essa aqui [a segunda] tem que abrir uma pra Dilma", teria afirmado Mantega. "Eu falei: 'ué, Lula, Dilma? mas vem aqui, eles sabem disso?'", perguntou Joesley.
"Sabem sim. Eu falo tudo pra eles", teria respondido Mantega.
Joesley contou ainda que pedia para tirar um extrato das contas e levava periodicamente para o ministro. "Dizia ele que ia mostrar para o Lula ou ia mostrar pra Dilma. E fica com aquele papel".
Até 2014, disse o empresário, o ministro nunca havia falado com ele sobre política ou doações eleitorais. No início da campanha daquele ano, "por volta de maio, junho", ele me chama e diz 'ó, eu precisava que você fizesse essas doações aqui'. Fez uma lista de partidos, de valores e tal".
"O Edinho Silva vai ser o tesoureiro da campanha, vai te procurar e você vai operacionalizando isso aqui com ele", teria orientado Mantega. De acordo com o delator os "saques" ocorreram até "zerar" as contas atribuídas a Dilma e Lula.
Outro lado
A defesa de Lula disse que as afirmações de Joesley Batista sobre ele nos trechos vazados à imprensa "não decorrem de qualquer contato com o ex-presidente, mas sim de supostos diálogos com terceiros, que sequer foram comprovados".
Por meio de nota, os advogados Cristiano Zanin Martins e Roberto Teixeira voltaram a afirmar que delações premiadas somente são aceitas pelo Ministério Público Federal se fizerem referência, "ainda que frivolamente", ao nome de Lula.
"Verifica-se nos próprios trechos vazados à imprensa que as afirmações de Joesley Batista em relação a Lula não decorrem de qualquer contato com o ex-Presidente, mas sim de supostos diálogos com terceiros, que sequer foram comprovados. A verdade é que a vida de Lula e de seus familiares foi - ilegalmente - devassada pela Operação Lava Jato. Todos os sigilos - bancário, fiscal e contábil - foram levantados e nenhum valor ilícito foi encontrado, evidenciando que Lula é inocente. Sua inocência também foi confirmada pelo depoimento de mais de uma centena de testemunhas já ouvidas - com o compromisso de dizer a verdade - que jamais confirmaram qualquer acusação contra o ex-presidente", diz a nota da defesa de Lula.
A referência ao nome de Lula nesse cenário confirma denúncia já feita pela imprensa de que delações premiadas somente são aceitas pelo Ministério Público se fizerem referência - ainda que frivolamente - ao nome do ex-presidente.
A referência ao nome de Lula nesse cenário confirma denúncia já feita pela imprensa de que delações premiadas somente são aceitas pelo Ministério Público se fizerem referência - ainda que frivolamente - ao nome do ex-presidente.
Em nota, a assessoria de Dilma diz que "são improcedentes e inverídicas as afirmações do empresário". E enumera três pontos: "1. Dilma Rousseff jamais tratou ou solicitou de qualquer empresário ou de terceiros doações, pagamentos e ou financiamentos ilegais para as campanhas eleitorais, tanto em 2010 quanto em 2014, fosse para si ou quaisquer outros candidatos. 2. Dilma Rousseff jamais teve contas no exterior. Nunca autorizou, em seu nome ou de terceiros, a abertura de empresas em paraísos fiscais. Reitera que jamais autorizou quaisquer outras pessoas a fazê-lo.3. Mais uma vez, Dilma Rousseff rejeita delações sem provas ou indícios. A verdade vira à tona."
Em entrevista à Folha neste mês, o ex-ministro Guigo Mantega negou envolvimento com irregularidades e afirmou que acusações como as de executivos da Odebrecht eram 'ficções' para conseguir fechar delação premiada, histórias "inverossímeis" e sem provas."
A defesa de Antonio Palocci afirmou que o ministro só se pronunciará nos autos.
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